Três curadoras assinam a exposição Um século de agora, que o Itaú Cultural abre no dia 17 de novembro e mantém em cartaz até 2 de abril de 2023. A sergipana Júlia Rebouças, a baiana Luciara Ribeiro e a matogrossense Naine Terena de Jesus foram chamadas pela instituição para curar esta mostra, que se insere nas discussões de 2022 sobre a Semana de Arte Moderna. Para puxar este legado em uma releitura que desemboca na prática artística na atualidade no país, elas pesquisaram o que está sendo produzido em algumas regiões do território nacional, a partir de uma multiplicidade de idades, geografias e vivências sociais e políticas.
Como parte da estratégia de investigação, convidaram um grupo de interlocutores para discutir os conceitos da mostra e compartilhar referências artísticas: Fernando Velázquez, Juma Pariri, Larissa Lacerda, Nuttyelly Cena, Orlando Maneschy, Ué Prazeres e Uelinton Santana Santos.
Idealizada e realizada pelo Núcleo de Artes Visuais do Itaú Cultural, com expografia da arquiteta Isa Gebara, Um século de agora procura abrir terreno para ideias que atravessam a experiência de viver o ano de 22 do século XXI. Nos três andares do espaço expositivo da instituição, a mostra apresenta mais de 70 obras em variados suportes, assinadas por 25 artistas e coletivos de 11 estados brasileiros, cuja produção artística converge na construção de “agoras” e compõe o mosaico da cultura brasileira.
Ao subir para este andar, o visitante é recebido pela obra Quartilhões e barricadas (2022), da pernambucana Amanda Melo da Mota. Trata-se de uma instalação, comissionada para a exposição, composta de sal grosso, água do mar, da chuva e de cachoeira, que atuam como agentes terapêuticos, junto a práticas realizadas pela artista no espaço. A carioca Julia Debasse, por sua vez, faz uma leitura de uma história tupi na obra Como nasceu a noite (2022), também criada especificamente para esta mostra. Em estrutura de madeira, a sua pintura é elaborada em forma de retábulo, na qual cada cena desse nascer se passa em um quadro.
Mais ao fundo, registros de ato do coletivo Revolução Periférica, em 2021, quando incendiou-se, , a estátua de Borba Gato, no bairro de Santo Amaro, em São Paulo, com o intuito de abrir o debate sobre a história e a representação de personalidades e imagens perpetuadas como monumentos. O grupo também emprestou, para esta mostra, as faixas Revolução periférica – a favela vai descer e não vai ser carnaval e A periferia segue viva, que, por meio de sua mensagem, alertam para repressões contra a população periférica.
Em nós estávamos esperando por vocês (2022), a poeta, filósofa e artista visual fluminense abigail Campos Leal apresenta cinco fotografias tiradas no período da covid19 até recentemente. Elas retratam divindades ancestrais em um cenário de cosmologia trans, imaginando o pós fim do mundo como um lugar de cura.
Ainda neste andar, ao longo da exposição será apresentado o Manto Tupinambá da artista e ativista Glicéria Tupinambá – nascida na aldeia Serra do Padeiro, na terra indígena tupinambá de Olivença, no sul da Bahia. Até a chegada do manto, o espaço será preparado com a exibição de registros em vídeo e desenhos do artista Gustavo Caboco – que tem obras expostas no piso -1 – demonstrando o processo de seu feitio, em uma representação da identidade, transformação e resistência dessa sociedade.
Na parede oposta, está a obra maura murou a casa com o mau da língua do mineiro (2022). Trata-se de uma instalação composta de objetos encontrados nos cursos d’água do rio São Francisco. Ela é assinada por davi de jesus do nascimento, artista plástico, performer e poeta barranqueiro curimatá, nascido às margens desse rio. A artista visual Carmézia Emiliano, da etnia Macuxi e moradora de Roraima, apresenta as obras A lenda do Caracaranã (2016), Damurida (2020), Minha gente (2018) e 25 anos fazendo arte (2017). Elas tratam da história de seu povo e seus costumes, como o preparo do prato de comida coletivamente e cenas de caça, pesca, e do lago Caracaranã, entre outras. Ao centro, a história da árvore Wazaká.
João Cândido da Silva é mineiro e vive em São Paulo desde pequeno, onde fundou a escola de samba Unidos do Peruche. Aos 85 anos, expõe um conjunto de obras produzidas em 2022, como Em busca de suas raízes, Liberdade e harmonia, Forró ao ar livre, Trio no pé da serra e Paradinha: só bateria!, além de Empinando pipa, de 1979 e Auto-retrato, de 2006. Nessas obras, ele homenageia a sua ancestralidade, tendo como inspiração as celebrações afro-brasileiras.
A pintora matrogrossense Dalva de Barros – 87 anos, sendo 60 de carreira – traz para a exposição suas pinturas de manifestações populares, atos políticos e transformações no cotidiano e na cultura de cenários rurais e urbanos do país, especialmente em Mato Grosso. As obras são: Missa para Alcides (1980), Almoço dos garis (1994), Brasil 500 anos (nada temos) (2000), Profissionais da saúde – a verdadeira eucaristia II (2020), produzida no contexto da pandemia de Covid19, e Fila dos ossinhos, esta última de 2022.
Fecha o percurso deste andar A TRÄNSALIEN, identidade pós-humana criada em 2015 por Ana Giselle, multiartista, produtora cultural e curadora. Ela apresenta a instalação COSMOVERSE (2022) mesclando em três vídeos – dois deles inéditos – referências afro-futuristas para sugerir uma experiência imersiva sensorial e intimista. Aqui o visitante é o centro do trabalho.
As obras que recebem o visitante neste andar são do artista fluminense Davi Pontes e da pernambucana Juliana Xucuru, ambas inéditas. Ele, coreógrafo, performer e cineasta, apresenta Conferência: racial ↔ não-local (2022), fruto de sua pesquisa sobre coreografia, autodefesa e racialidade. Ela, artista visual, professora, pesquisadora e curadora, mostra Tew ni intanha/ água de ganho (2022). A obra faz alusão às mulheres indígenas xucuru, escravizadas em seu próprio território. O trabalho trata, também, de sua relação com a água sagrada – elementar para o cuidado dos seres e dos solos, cuja falta coloca todos em risco no presente e no futuro.
De Aislan Pankaruru, artista visual e médico pernambucano, neste andar pode se ver as séries Evocações (2022) e Rastros (2021). A primeira revela a força, a cura e a iluminação em gestos que se aproximam da pintura corporal do povo Pankararu. A segunda é um conjunto de desenhos em papel kraft inspirados nos trajetos e nas pegadas que deixamos no caminho. Outras três obras do artista estão exposta no andar de baixo.
Seguindo por este piso, Luana Vitra apresenta A transformação é uma esquiva (2021/2022) e Fio desencapado – isca de confusão (2021/2022). A mineira, crescida em Contagem, artista visual, dançarina e performer, investiga o próprio corpo a partir do movimento de materiais brutos, como o ferro. Nas obras em exibição, ela explora os conceitos de identidade, fuga, dúvida, permanência e transformação.
José Bezerra foi caçador, lenhador e exerceu ocupações de um homem do campo. Descendente dos índios guerreiros da etnia Funiô, nascido em Buíque (PE), vive no sítio Igrejinha no Vale do Catimbau. Ele conta que uma noite, em um sonho, descobriu que poderia fazer arte com troncos de umburana deixados em seu caminho, pela própria natureza. A partir daí, passou a se dedicar a transformar estas madeiras em esculturas de seres extraordinários e passou a viver da arte.
Em outra ponta, a artista visual e cineasta amazonense Keila Sankofa traz a instalação Óculos de Okoto (2022), na qual exalta divindades africanas e recupera a grandeza de símbolos como os búzios. Em Vingança de Cam (2022), obra da paulista artista visual e arte-educadora Juliana dos Santos, o suporte é a fotografia, aquarela e a cor de pétalas da flor azul clitoria ternatea. Aqui, ela enfatiza a luta dos movimentos negros e sociais ao longo do século XX para a manutenção da vida e da identidade de pessoas negras no Brasil. O título da obra faz referência à tela A redenção de Cam (1895), de Modesto Brotos, que trata a tese racista de “branqueamento” social.
O artista wapichana Gustavo Caboco vive na linha Curitiba-Roraima. Ele traz para a exposição encontros di-fusos (2022), obra composta de vídeo, desenhos, fios, bordados, fotografias e objetos. Feita entre 22 fusos de fiação de fibras naturas, nesta obra o artista propõe ampliar as conexões entre memórias, pessoas, povos, línguas e temporalidades. Ele estabelece conexões reminiscentes dentro do tronco linguístico aruak, do qual fazem parte os povos Terena, Baniwa, Wapichana e Palikur, entre outros.
Por fim, este, que é o segundo subsolo, reúne mais sete artistas. De Sara Lana, artista e desenvolvedora mineira, a obra Orelhinhas (2022) tem como base os telefones públicos conhecidos como “orelhões”. Neste trabalho, eles servem de microfone para a gravação das conversas que ela realizou com moradores ribeirinhos, ao longo dos rios São Francisco e Jequitinhonha, ligando para orelhões onde eles vivem.
O artista, curador e ativista indígena Denilson Baniwa mostra Pietá Piatã (2021), em um paralelo entre a figura mitológica dos macuxi de Roraima – a Piatã – e a Pietá, obra clássica da história da arte ocidental que representa Maria segurando seu filho Jesus, morto em seu colo. A série Ficções coloniais (2021), outro trabalho dele, também participa da mostra.
Dois coletivos integram a exposição neste piso: o grupo Ururay e o Coletivo MT. O primeiro, criado em 2014 para fortalecer ações de preservação e valorização dos patrimônios culturais da região Leste de São Paulo, apresenta Envolvimento (2022). Trata-se de uma instalação inédita com um cordão formado por cerca de quatro mil sementes de capim-miçanga, confeccionado em mutirão pela comunidade do Rosário dos Homens Pretos da Penha de França, além de documentação e registros que tratam da vida e ocupação negra histórica nessa região da cidade.
Por sua vez, o Coletivo MT – formado por Ruth Albernaz, artista-bióloga cabocla, que vive na Chapada dos Guimarães (MT); Téo de Miranda, de São Paulo; e Paty Wolff, nascida em Cacoal (RO) – apresenta a obra-manifesto Agora quando!? (2022). Este trabalho reflete sobre o modelo de ocupação e de desenvolvimento em monoculturas para a produção de commodities no estado de Mato Grosso e seus efeitos nos modos de vida e nas culturas originárias dessa sociedade.
Pintor e desenhista, Roberto Magalhães, do Rio de Janeiro, desenvolve obras com temáticas místicas, com referências surrealistas e abstratas. Nesta mostra, são expostas duas de suas telas de 202: Alma e Usina II. Há também cinco desenhos de simbologia mística – Portal, Todos buscam todos querem, Sonho e Quod habet principium et finem habet –, além de gravuras históricas que integram a coleção do Itaú Cultural.
Neste andar, o visitante volta a encontrar obras de Aislan Pankaruru. Em Aba pukuá – homem céu, Guardiã e 4,5 bilhões mostra a força das mulheres pankararu, detentoras de ciência milenar e da resistência, do amor e da germinação. Lidia Lisboa, artista visual, ceramista e performer, de Guaíra (PR), apresenta a instalação Úteros (2022), composta por objetos semelhantes ao órgão que dá nome à obra, de tamanhos diversos, produzidos a partir de costura manual com agulha de crochê e tiras de tecido. A obra da artista, curadora e diretora de fotografia cearense Linga Acácio propõe um diálogo entre a hipertermia corporal e o aquecimento do planeta, especialmente do mar, na videoinstalação À beira do inferno (2022).
Abertura: 17 de novembro, a partir das 20h
Visitação: 18 de novembro a 2 de abril de 2023 Terça-feira a sábado, das 11h às 20h Domingos e feriados das 11h às 19h
Curadoria: Júlia Rebouças, Luciara Ribeiro e Naine Terena de Jesus
Idealização e realização: Itaú Cultural
Itaú Cultural
Avenida Paulista, 149 – próximo à estação de metrô Brigadeiro
Pisos 1, -1 e -2
Entrada: gratuita
Informações: pelo telefone (11) 2168-1777 e WhatsApp (11) 9 6383 1663
De terça-feira a domingo, das 10h às 18h.
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